quarta-feira, 29 de maio de 2013

a outra

O que eu vi nele? Ela. Se era bom o suficiente para Helena, seria, também, para mim. Ele me confidenciou que ela quase nunca o beijava. Então eu o beijei. Sem mais, nem menos. Na escada de serviço do prédio, onde estávamos a pretexto de fumar. Talvez seja o cheiro de cigarro?, sugeri. Não, ela disse que não gosta de beijar, respondeu, e beijou-me. Beijava bem, com intenção e intensidade. Não tinha mau hálito. A barba, muito espessa, arranhava a pele. Mas isso não era motivo para deixar de beijar. Talvez fosse, para Helena, pensava, enquanto ele me imprensava na parede e enfiava a mão por baixo do meu vestido. Passamos a nos encontrar duas vezes por semana. Minha pele vivia irritada, descamando. Um ano depois, quando Helena descobriu, ele quis mudar para a minha casa. Eu não aceitei. Minha pele ficou ótima.




Raul foi casado com Marina por quase 15 anos e está com Fernanda há 5. Elas são muito amigas. Mulheres civilizadas. Fortes, bem-sucedidas, bonitas. É de um homem como Raul que preciso. No começo, ele não me dá muita bola. Mas, sei esperar. Ficamos amigos. Sempre o encontro na hora do almoço. Trabalha no prédio ao lado do meu escritório. Fico na portaria, fingindo falar ao telefone, até vê-lo passar. Quase sempre dá certo. É um homem de rotina. Fala muito de Fernanda. Eu ouço com atenção. Espero. Sempre vale a pena. Em alguns meses, a crise chega. Fernanda não gosta de rotina. Eu gosto. Às segundas e quartas, almoçamos no motel. Às terças e quintas, Raul almoça com os amigos e eu no escritório. Às sextas, emendamos um almoço tardio com uma happy hour e depois transamos no meu apartamento. 



Seis meses depois, Raul aparece na minha casa, no sábado, carregando uma mala. Contou tudo para Fernanda e foi embora. Eu o mando para um hotel. Ele não compreende, mas vai. No domingo, Marina me procura, furiosa. Qual é o seu problema?, grita. Ela ainda é muito bonita. Eu a convido para entrar. Ofereço uma bebida. Espero que se acalme. Podemos ser amigas. Eu não tenho problema, tenho método. 


foto: Marcelo Huet Bacellar

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Quem é ela? Ou Sexo x Realidade

texto de Jorge Henrique Cordeiro - para ser lido após

 


- Você volta amanhã?

- É, minha irmã caiu no banheiro e precisa ir ao médico. Desculpe, não tem outro jeito, preciso voltar.

- E não tem ninguém que possa levá-la? Tem que ser você?

- O que você quer que eu faça? Deixe minha irmã se virar sozinha?

- Tá, eu sei, eu sei, ela ajudou a criar você quando sua mãe morreu, blá blá blá…

- Você é muito egoísta. Não gosto desse seu jeito…

- E eu não gosto quando você fuma esse cigarro fedorento no meu quarto. Pode pelo menos ir pra varanda?

- Engraçado, você dizia que gostava até do cheiro, que deixava um gosto bom na boca, que me dava um cheiro de macho.

- Tá, eu sei, mas você anda fumando muito. O cheiro desse troço é forte demais.

- Você podia ser mais compreensiva num momento difícil como este. Cadê aquela mulher doce que conheci na viagem?

- Deve ter se perdido junto com minhas malas na volta… Aliás, tenho que ligar pra companhia aérea pra ver se já acharam. Me passa a bolsa?

- Levanta e pega, uai.

- Grosso!

- Grande e grosso! E você gosta.

- Babaca. Deve ser por isso que nenhuma mulher quis casar com você. Quem vai querer conviver com um ogro?

- Mulher não falta nesse mundão que queira a boa vida que posso dar a elas. Mas casar pra quê se sempre tem uma dona solta por aí…

- Caramba, o que foi que vi em você? Me diz?

- Um homem como deve ser e Deus permite.

- E ainda carola! Céus!

- Seu problema é falta de Deus, já te falei…

- E o seu é falta de noção. Vai, volta pra ajudar sua irmã. Me deixa dormir.

- Para de bobagem e vem cá fazer um chamego no seu homem…

- Sai com essa piroca pra lá. Hoje não vai rolar nada. Perdi o tesão.

- Deve estar numa das malas extraviadas. Mas tudo bem, eu dou conta, e você vai gostar mesmo assim…

- Olha, eu sabia que você era bronco, mas tá passando dos limites. Vou dormir, boa noite. Se quiser, pode ficar aqui, no quarto ou na sala, se preferir. Mas me deixa. Ou prefere que eu chame um taxi?

- Tá me expulsando? Ára, você se irritou por besteira e ainda quer sair por cima? Tome tenência, muié!

- Fala baixo. Ou melhor, não fale nada. Boa noite!

- Vocês dondocas da cidade são todas iguais, uma hora estão todas derretidas e n’outra mais duras que lombo de mula.

- Fecha a porta quando sair.

- Fecha você.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

MELECA




texto de autor anônimo para ser lido apóshttp://beatrizmoreiralima.blogspot.com.br/2013/04/quem-e-ele-ou-sexo-x-realidade.html 



Tenho 48 anos e, como dizia aquela canção, “já tive mulheres de todas as cores, de várias idades, de muitos amores”, mas nunca deixei que nenhuma delas tomasse conta da minha vida. A única mulher que tinha esse direito era a minha mãezinha, que infelizmente Deus levou muito cedo. Nem a minha irmã, por quem tenho um carinho e um respeito enormes, eu admito que se meta nos meus assuntos.

Então fiquei até sem palavras quando essa moça veio me repreender. Mulher nenhuma me repreende. Aliás, nem homem. Só meu falecido pai, que Deus o tenha. E não era com conversinha mole e fricote, era na vara e no cinto. Meu pai me educou pra ser macho acima de tudo. Não foi pra ouvir sermão de mulherzinha. Pra ficar sendo questionado...

“Ah, por que você nunca se casou? Tem filhos? Você não acha que a sua relação com a sua irmã pode ter atrapalhado o seu relacionamento com as mulheres? Não dá atenção demais aos problemas dela? Afinal, ela não é sua mãe...”. E por aí vai... Será que essas mulheres da cidade não aprenderam a respeitar um homem? Eu por acaso fiquei perguntando por que ela mantém um gato gordo preso dentro de um apartamento? Perguntei por que ela não deu um filho ao sujeito com quem foi casada por quase 10 anos? Falei alguma coisa de ela viajar sozinha pro exterior, se deitando com um desconhecido como uma mulher da zona?

Não. Eu gostei da moça. Cada olhão grande e brilhante... parecia que tinha chorado... Mas, não, tinha o riso frouxo. A pele macia, as carnes no ponto. Não era toda dura e malhada, tinha onde pegar, do jeito que eu gosto. Porque quem gosta de mulher esquálida é viado, assim mesmo é pra vestir e não pra comer...

Uma pena. Eu tava até disposto a relevar um monte de coisa. Fiz que não percebi o jeito dela com minha irmã. Cara de quem tá sentindo cheiro de peido... Não comeu a compota de jaca feita especialmente pra ela. Dieta. Pelo menos comeu o churrasco. Depois apareceu na fazenda na hora que minha irmã tava no hospital e começou a dar ordem nos empregados e mandar fazer as coisas diferente do que sempre fizeram. Não liguei, pra mim, tanto faz.

Tava tudo indo bem. Não exijo muito, a mulher sendo fogosa, cheirosa e sem frescura, pra mim tá bom. O problema começou nessa última vez, na casa dela. Primeiro me azucrinou a paciência porque eu não tinha lido lá uns livros que ela achava que todo mundo devia ler. Expliquei, com toda calma, que não gosto de ler. E ponto. Só leio jornal e revista. Depois começou com umas frescuras na cama. Disse que não tinha mais clima. Ora, meu Deus, mas que clima? O quarto todo fechado, o ar-condicionado ligado, nós dois pelados. O que mais precisa? Só porque o telefone tocou e eu tive que falar um pouco com a filha da cozinheira que estava lá ajudando a minha irmã?

Ainda estava disposto a relevar. Mulher é assim mesmo, são todas cheias de nove horas. Só que aí ela resolveu dizer que eu tinha grudado uma meleca na cabeceira da cama! Peguei minhas tralhas e fui-me embora. Não vou discutir meleca com uma mulher doida. Eu grudei mesmo a meleca lá. Mas foi à noite, porque ela tava dormindo e tava muito escuro pra eu ir até o banheiro. Não quis acender a luz, para não acordá-la, mas tive medo de sair no breu do corredor e dar de cara com o gato. Eu tenho medo de escuro. E não gosto de gatos. Mas jamais diria isso pra mulher com quem estou trepando.